Com passagem pelo Inter em 1999, Paulo Autuori, atual técnico do Botafogo, se mostrou totalmente contrário ao retorno das competições do futebol brasileiro na atual situação enfrentada pela crise de pandemia de Coronavírus, enquanto o Ministério da Saúde deu parecer favorável à retomada dos torneios em documento enviado à CBF na semana passada.
O treinador falou ao programa Esporte Espetacular, da Globo. "Me parece uma sandice falar sobre o retorno das equipes de futebol neste momento. Falta de respeito diante de tantas mortes e sofrimentos. Demonstra uma preocupante falta de conhecimento dos responsáveis a favor dessa medida sobre a complexa rotina dos treinamentos de futebol. Ausência de preocupação e de respeito aos profissionais, especialmente daqueles mais sacrificados, que não são jogadores nem membros da comissão técnica. Nós, profissionais, merecemos respeito". Para completar: "Querem futebol de volta? E daí? Lamento" declarou o técnico do Botafogo, referindo-se a fala do presidente Jair Bolsonaro à imprensa sobre os números de vítimas no país.
Sandice, segundo o dicionário, refere-se a "qualidade ou caráter de quem age ou fala como um tolo ou como um simplório, dito, pensamento ou ação a que falta lógica, nexo, ou está fora da realidade; contrassenso, loucura", com os motivos mais fundamentados na ciência explicitados logo abaixo.
Em entrevista ao programa Sala de Redação, da Rádio Gaúcha, neste domingo (3), o presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Fernando Spilki, opinou sobre o reinício dos treinos. O pesquisador ressaltou a dificuldade de aumentar a flexibilização para outras atividades. Em uma área específica, é possível aplicar um protocolo rígido de segurança e fiscalizá-lo. No entanto, ele reforça que de forma alguma o futebol pode ir contra as normas preconizadas pelas autoridades, além de que o risco zero é praticamente impossível de se alcançar.
Já de acordo com a BBC, em comparação a outros países, o Brasil tem a maior taxa de transmissão da doença, estando entre os que menos fazem testes e com a oitava maior taxa de mortes. É importante lembrar que cada país tem uma capacidade diferente de realizar testes na população para identificar que contraiu o vírus, e adota uma metodologia própria para contar seus mortos.
Além disso, países vivem momentos diferentes da pandemia. A Nova Zelândia praticamente zerou o número de casos, e a Itália deixou o pico para trás há semanas. Os Estados Unidos parecem estar passando do auge da doença e o Brasil ainda não chegou lá, segundo os especialistas.
Um estudo divulgado pelo Imperial College de Londres apontou nesta semana que o Brasil está com uma taxa de contágio da doença de 2,81, a mais alta entre 48 países analisados. Isso significa que uma pessoa infectada transmite a covid-19 para cerca de três pessoas.
O indicador, conhecido como R0 (“r zero” ou “r naught”), mede aqui o número médio de infecções geradas por alguém que contraiu o novo vírus (Sars-CoV-2).
Assim, se esse R0 é menor do que 1, o número de casos cairá gradualmente até zero, já que haverá cada vez menos gente infectada. Se é maior do que 1, o vírus se espalha de modo exponencial.
No Brasil, 10 pessoas infectam hoje outras 28, e estas infectam mais 78. Quanto mais alto for o R0, maior a bola de neve. Nos primeiros quatro meses de 2020, o Ministério da Saúde brasileiro registrou 85.380 casos de coronavírus e 5.901 mortes da doença no Brasil.
Essa taxa de reprodução básica do vírus pode ser calculada a partir do modelo epidemiológico SIR, que se baseia em dados como o número de pessoas Suscetíveis, Infectadas e Removidas (recuperadas ou mortas, por exemplo). A qualidade das estatísticas oficiais influencia diretamente a precisão das estimativas.
Hoje, a estratégia mais eficiente ao redor do mundo para diminuir essa taxa, contendo a pandemia, tem sido o isolamento social. Ainda segundo à BBC, um monitoramento feito pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) aponta que o número de pessoas infectadas e mortas no Brasil dobra a cada 5,1 dias. Apenas dois países aparecem acima do Brasil: Rússia e Sudão.
Vale lembrar que cada país adota metodologia própria e em um momento distinto da pandemia. O governo brasileiro estima que o pico da pandemia ocorrerá entre maio e junho, o que deve aumentar bastante o número de mortes. Se o Brasil atingir a taxa italiana, por exemplo, isso representaria 100 mil mortos. Estima-se que a covid-19 leve ao óbito 2 a cada 100 pessoas infectadas.
Em geral, a qualidade dos dados usados (quantidade e nível de detalhamento, por exemplo) para uma projeção é mais importante para a acurácia dela do que o modelo matemático adotado.
Na pandemia atual, isso está ligado diretamente ao número de testes realizados para identificar se alguém contraiu o coronavírus ou não. Quanto mais exames, mais perto a estatística oficial estará da realidade. Quanto menos, maior a subnotificação.
Todavia, na prática, o governo brasileiro não sabe dizer quantos testes são realizados por dia no país. Os números do Ministério da Saúde não incluem testes realizados em hospitais e clínicas particulares, somente na rede pública de saúde.
O Brasil tem enfrentado uma série de dificuldades para ampliar sua capacidade de realização de testes, como a concorrência internacional para comprar insumos, alta de preços e demanda maior que a capacidade de análise dos laboratórios.
Ante a subnotificação, especialistas tentam calcular qual é o número real de infectados do país. Para se ter uma ideia, um estudo coordenado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) apontou que para cada pessoa contaminada por covid-19 no Rio Grande do Sul, há 12 casos não notificados.
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