Especialista sobre história explica bases fundantes do Inter e ligação com os negros

Texto por Colaborador: Redação 09/07/2020 - 02:00

O canal colorado Vozes no Gigante, dos jornalistas Alexandre Ernst, Leandro Behs e Lucas Collar entrevistou na semana passada Tiago Vaz, especialista sobre a história do Internacional, com um amplo acervo e conhecimento sobre o Clube do Povo. Trazendo tópicos bastante interessantes sobre a linda história alvirrubra, confira alguns desses principais trechos que pode ser desconhecido para muitos torcedores. 

"A fundação do Inter foi um processo de concepção em torno do amor, das relações da juventude daquela época, que estavam encontrando no esporte coletivo, nas praças recém inauguradas de Porto Alegre, lá em 1900, a oportunidade de se expressar também, de se relacionar. Ai chega um livro da Europa, com essa gurizada que estava em forma e se exercitando, Poa estava vivendo a inclusão dos negros na sociedade, recém libertos da escravatura. E havia aquilo "como iremos receber eles, como iremos se relacionar". Um cenário com contexto muito onde a europa ditava as tendências e não os EUA. Porto Alegre estava fervilhando sobre o esporte e o ciclismo era o principal esporte. O Inter nesses encontros esportivos nas praças ia até Rio Pardo onde tinha um cara da capital, era uma das pessoas mais influentes e ele instigava a juventude a trazer novas propostas, a lerem coisas diferentes, e ai chegou o livro das regras. Que tinha um livro que se chamava o livro da vida, e esse livro tinha as regras do futebol e começaram a jogar esse jogo, como brincadeira. Que começou a ser praticada não só nas praças de Porto Alegre mas nessas áreas adjacentes, que deu liberdade a esses jovens de pensar de maneira mais ousada naquele momento. E eles praticaram futebol e em breve aconteceu essa coisa instantânea: virou um time que jogava futebol. Então quando eu escrevi sobre essa teoria o Ibsen Pinheiro, saudoso, também escreveu na ZH à respeito, dizendo que o Inter teria acontecido de qualquer jeito. Nao era um fato ou uma reação ao Grêmio, porque eles nos rejeitaram. Não, a ideia já estava vivendo na sociedade, que de uma forma ou outra ia encontrar equipes que iam revalizar. Nada mais natural que rivalizar contra um time que já estava posto, configurado, contra os novos desafiantes (no caso o Inter)".

Opção pelo nome: "O Internacional nasce como uma expressão que a gente pode dizer como a globalização hoje, que nos remete a um contexto global, Internacional era a palavra do momento, porque dizia: aqui pensamos de todas as nações, de um pensamento talvez de controponto ao ufanismo nacionalista, que tinha muito. Muita gente fantasiou que o nome veio por causa da Inter de Milão, o nome do Inter em NADA tem a ver com a Inter de Milão...".

Caráter do clube:"O Henrique Poppe Leão tomou vários chocolates do Grêmio e ele nunca desistiu. Nunca desistiu e se ele tivesse desistido o Inter não teria existido. Ele fundou o Inter, fez alguns jogos e ai logo apareceu a oportunidade de enfrentar um dos times que era um dos principais da cidade. E ele enfrentou esses times e tomou um chocolate, daqueles que até hoje nunca mais se repetiu. E eu acho que essa coragem, é a conexão dos colorados. Entender que não é a respeito de hoje, mas daqui a pouco. E ele não só fracassou, ele poderia ter se sentido humilhado, pensar "porque vou continuar fazendo isso", e ele se uniu a outras pessoas que também haviam tomado um chocolate, e passou a construir em torno uma nacessidade de falar: olha, não estamos enfrentando apenas jovens que são atleticamente superiores a nós, estamos colocando uma ideia para funcionar. Nessa ideia ele achou o maior jogadores da história do Inter para mim, o Dr. Carlos Kluwe, vou compará-lo a Fernandão. Ele foi quem entendeu o que tava na cabeça do Henrique Poppe, e o Henrique logo sacou os irmãos dele do time, porque eles não eram tão bons, e junto com o Carlos Kluwe ele ganhou do Grêmio antes de morrer, no que considero o jogo mais importante da história do Inter. Aquele jogo saiu em todos os jornais, o dia em que Inter e Grêmio foram parar nas manchetes.  Foi quando a rivalidade foi percebida pela imprensa local e nunca mais parou-se de falar de futebol, isso em 1915. O Henrique Poppe Leão morreu pouco tempo depois e o Carlos Kluwe se tornou o grande ícone esportivo a partir desse momento. Ele foi não só responsável por essa primeira vitória em GreNal, como começou a aparecer como uma celebridade do futebol. Ele inventou um jeito de se destacar nas fotos, enquanto o time todo posava olhando para frente, ele virava a cabeça".

Ligação popular e a abertura do espaço aos jogadores negros: "Essa coisa é fantástica, os negros estavam presentes na fundação, Mas os negros não podiam jogar bola. Então tem uma das fotos que nós descobrimos que tem um gurizinho negrinho, junto com o Inter, um mascote. Tem outra foto que é a feição de um negro também ali abraçado junto com os atletas do Internacional, com roupas mais simples. Então assim: a questão deles não poderem jogar futebol, é uma realidade, nem no Inter podia. A sociedade ainda estava com cicatrizes pós-escravidão. Mas pra ti ver a coragem desses rapazes de colocar essas ideias. Eles sem dúvida articularam para isso começar a ser resolvido, tanto é que quando a oportunidade apareceu eles foram um dos primeiros. Ai quando a liga da Canela Preta apareceu pra jogar bola nas pracinhas, eles foram lá e convidaram. Eles foram um dos pioneiros, a ideia surgiu no Vasco, no RJ, e certamente quando chegou aqui por telegrama, ascendeu a faísca, e não foi só no futebol. Foi na música, no carnaval. Então tem uma série de evoluções que começam a aparecer na sociedade por causa do futebol, quando ele fora das 4 linhas faz as pessoas pensarem. Essa questão de ser Internacional era a ideia de reunir, compartilhar, ser de todos. Quando a Liga da Canela Preta surgiu, os colorados da época foram atrás dos negros".

"Vicente Rao é um dos maiores festeiros da história de Porto Alegre. A turma dele estava presente em todos os jogos. São pioneiros em uma festa diferente nas arquibancadas".

"A doação do terreno do Beira-Rio era um plano que existia na cidade, já. Mas era um deboche, sem dúvida".

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